“A ideia de heresia certamente muda com
frequência, conforme quem esteja no poder. Mas o que houve com os livros que
foram considerados perigosos?”
Heresia é
um suspense histórico pra ninguém botar defeito. Eu, particularmente, amo o gênero,
e, portanto, não poderia estar mais satisfeita com a leitura. Diria que além de
boas doses de ação, mistério e pinceladas históricas, o livro é um jogo de política
e interesses.
A história se inicia com o monge italiano Giordano
Bruno fugindo do mosteiro na Itália, por ser descoberto fazendo leituras
proibidas.
Tendo a mente muito à frente de seu tempo, ele
peregrina pela Europa, sempre defendendo suas ideias, e acaba tornando-se um
filósofo de respeito da corte francesa.
“Ele achou que podia se igualar a Deus. E
esse também é o seu pecado, frei Giordano Bruno. Você é um dos jovens mais
talentosos que já encontrei em todos esses anos em San Domenico Maggiore, mas
sua curiosidade e o orgulho que tem da sua inteligência o impedem de usar seus
dons para a glória da Igreja. Está na hora de ser interrogado pelo padre
Inquisidor” (Pág. 6).
Então, o livro salta sete anos. Giordano, agora com
trinta e cinco anos, muda-se para a Inglaterra, mais uma vez ameaçado de ser
descoberto pela Inquisição.
O ano é 1583 quando ele parte para Oxford em uma
missão secreta.
Aparentemente, ele é apenas um membro da comitiva
real, indo participar de um debate a respeito da teoria de Copérnico. Porém, na
realidade, ele foi requisitado pelo serviço de proteção à rainha da Inglaterra,
que é protestante. Já tendo rompido com a Igreja Católica anos atrás, Giordano
agora deve se infiltrar nos bastidores de Oxford para descobrir e delatar
aqueles que seguem a antiga religião e fazem parte de um complô para derrubar a
rainha e trazer de volta a religião do Papa ao país.
E logo no início de sua estadia na Universidade,
Giordano testemunha um crime terrível que, para o espanto da comunidade
aparentemente pacata de estudiosos, acaba sendo apenas o primeiro de outros
assassinatos que ocorrem no Colégio.
A mente aguçada de Giordano começa a entender as
pistas deixadas pelo assassino e a relação dos crimes com intrigas religiosas.
Assim, a missão secreta entremeia-se à sua nova
missão para descobrir o autor dos crimes, enquanto ele mesmo passa a correr um
terrível perigo.
“– É uma esperança ousada – concordou ele
– Mas, para a maioria dos habitantes desta cidade, senhor, serei sempre o filho
de um herege exilado.
– Bem, eu sou um herege exilado, portanto, saio ganhando” (Pág. 211).
Heresia é
uma obra-prima, e, o melhor de tudo, é que se trata de uma série, na qual
teremos sempre Giordano como protagonista de tramas de mistérios seculares e
intrigas religiosas. Inclusive, um livro lendário, que nosso protagonista
anseia muito encontrar, fica como um dos maiores ganchos a serem desenvolvidos
nos próximos títulos da série.
Devo apenas alertar que, talvez, algumas pessoas
possam encontrar certa resistência na leitura aqui indicada, uma vez que ela
não tem papas na língua para falar sobre religiões, chegando a criticar várias
crenças e seus adeptos. Claro, deve ser lembrado que o livro não é
necessariamente opinativo (a fidelidade religiosa de certos personagens não
fica clara, portanto, a da autora fica menos ainda) e que a religião, ao longo
de Heresia, é tratada acima de tudo
como política. Porém, pesquisei superficialmente e percebi que o livro pode não
agradar a todos por não ter medo de ousar.
Muito do que se passa na obra de ficção Heresia é real, a custo de vastas
pesquisas realizadas pela competente S. J. Parris, e certas cenas, por sabermos
que são praticamente fiéis ao que se passou na Europa séculos atrás, nos fazem
refletir muito a respeito da humanidade, seja sobre seu passado, seja sobre a
forma como as atitudes do passado moldaram o presente que hoje conhecemos, ou
seja através de um paralelo que nossa mente acaba traçando (talvez, sem
perceber) de como certos erros ainda são cometidos, tanto tempo depois.
“Jogar politicamente com a vida alheia
era parte do caminho para a promoção social, mas essa, como eu estava começando
a compreender, era a verdadeira heresia” (Pág. 338).
Confesso que há uma cena um pouco forte, para o meu
gosto pessoal, no final do livro. Sinto-me na obrigação de alertá-los quanto a
isso (não se trata, neste caso, de caráter religioso, mas de violência mesmo),
embora eu também precise deixar registrado que em nada isso tira o brilho do
livro como um todo. Assim como é preciso esclarecer que praticamente não há
romance na obra, o que pode desagradar alguns. Eu, particularmente, adoro
livros focados em questões históricas e em suspense, portanto, não reclamo.
Não posso concluir esta resenha sem citar a
incrível habilidade que a autora teve em retratar a vida real de Giordano
Bruno, com muitos detalhes do que realmente se tem documentado, transpondo isso
para uma narrativa fictícia, em que realidade e ficção mesclam-se, separadas
apenas por uma linha tênue. Vários personagens da obra são reais e foram
importantes na vida de Giordano. Um bom exemplo disso é que sua amizade com Sir
Philip Sidney, presente na narrativa de Heresia,
é uma amizade que realmente existiu, assim como sua proteção por parte da
embaixada francesa nos anos em que viveu em Londres. São muitos detalhes, que,
com certeza, enriquecem e fazem da série literária de S. J. Parris uma obra a
ser indicada e apreciada por todos os amantes do gênero.
Trecho: “As pessoas entre as quais eu me
encontrava, disfarçado, acreditavam sinceramente estar na presença de um
mistério sagrado. Sua crença nisso era uma fé pura que eu esquecera fazia muito
tempo (...). E era a fé nesse milagre que as chamaria de volta, vez após outra,
a despeito das ameaças de morte e de castigo, para manterem desafiadoramente
viva aquela chama, e a sinceridade de sua fé foi quase humilhante” (Pág. 270).
Informações:
Título:
Heresia
Autora:
S. J. Parris
Gênero:
Suspense, Ficção Histórica.
Editora:
Arqueiro
Páginas:
360
Borboletas azuis:
Confira a resenha do segundo volume desta série, Profecia, clicando aqui.
3 comentários:
Nossa, fui totalmente conquistada por essa resenha, vou correndo incluir esse livro na minha lista de leitura. Gosto muito de livros que envolvam história e o enredo parece muito interessante. Grande Beijo!
Camila - Meu Livro Cor-de-Rosa
http://meulivrocorderosa.blogspot.com.br/
Oi Camila! Que bacana seu comentário, fiquei muito feliz de saber que minha resenha te incentivou a conhecer o livro! Espero que goste da leitura.
Beijos e volte sempre!!
Oie *-* Quase não leio livros no estilo de Heresia, e não por causa do tema dele, mas tem horas que parece que ando lendo só as mesmas velhas coisas rsrs gostei da forma que você apresentou o livro :) Gosto de autores e livros que não tem medo de "tocar na ferida" de alguns, uma pena a cena de violência no fim (Sou uma molenga para elas kkkkkk) fiquei interessada para conhecer mais da obra, valeu pela dica ^^
Beijos, Jhey!
www.passaporteliterario.com
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